Deficiência e virgindade aos 40… até o dia em que buscou abrigo na tempestade.
José Almeida tinha quarenta anos e estava convencido de que o amor simplesmente não fazia parte do seu destino.
Vivendo sozinho numa casa de madeira no alto da Serra da Estrela, resignara-se à solidão depois de décadas de humilhação e rejeição.
Nascido com paralisia cerebral, mancava ao caminhar, o braço direito tinha força limitada e a fala arrastada era muitas vezes considerada estranha. Mas o que realmente o marcara não era o corpo—era a forma como os outros o tratavam por causa dele.
Aos vinte e cinco anos, ousara convidar uma colega de trabalho, Sofia, para sair. A resposta dela destruiu-o: “És gentil, José, mas nunca poderia estar com alguém como tu. O que é que as pessoas iriam dizer?” No dia seguinte, ela contou aos outros no escritório, e ele tornou-se alvo de piadas cruéis. Aquela humilhação foi a ferida final. Os pais, embora amorosos, também não ajudaram. O pai dissera-lhe uma vez: “Homens como nós não são feitos para casar. Foca-te no trabalho.”
Então, José fugiu.
Usou as suas poupanças para comprar uma casa isolada, onde ninguém pudesse ter pena dele ou gozar com ele. Durante oito anos, viveu numa rotina rígida: acordar às seis, beber café preto, alimentar os três cães que resgatara—Zé, cego; Estrela, de três patas; e Pipa, surda—e passar horas a programar como freelancer. Sem ninguém para o magoar, achava-se seguro. Mas também estava profundamente só.
Naquele novembro, enquanto uma tempestade violenta sacudia a serra, ouviu-se uma batida à porta. José congelou. Visitas eram raras, e ele evitava estranhos há anos. Pela janela, viu uma jovem ensopada, a tremer de frio. Tudo nele gritava para ficar em silêncio, mas a compaixão venceu. Abriu a porta.
“Menina, está tudo bem?”, perguntou, com a voz instável.
A mulher—Lúcia Mendes, fotógrafa de trinta e quatro anos—pediu desculpa, ofegante. O carro dela avariara, o GPS falhara e ela caminhara horas sob a chuva. José quis apenas entregar-lhe um telemóvel e mandá-la embora, mas a tempestade tornava isso impossível. “Entre”, disse, relutante. “Não pode ficar aí fora.”
Lúcia entrou, pingando água no chão.
Os cães rodearam-na imediatamente, Estrela encostando-se a ela como se sentisse confiança. José entregou-lhe toalhas, ofereceu chá e explicou que não havia sinal de telemóvel até a tempestade passar. Lúcia, ainda a tremer, sorriu agradecida e apresentou-se. Ele reparou como ela olhava diretamente nos seus olhos, sem hesitar perante o seu andar ou o braço debilitado. Pela primeira vez em anos, alguém falava com ele sem julgamento.
Naquela noite, Lúcia dormiu no quarto de hóspedes enquanto a tempestade rugia lá fora. José ficou acordado, perturbado por um calor estranho que lhe aquecia o peito. Será que alguém podia realmente vê-lo para além da sua deficiência?
Na manhã seguinte, preparou o pequeno-almoço nervosamente. Quando Lúcia se juntou a ele, a simplicidade doméstica de duas pessoas a partilhar café parecia quase irreal. Ela perguntou-lhe sobre a sua vida na serra, genuinamente curiosa. Relutantemente, José admitiu que se afastara das pessoas porque “elas podem ser cruéis, especialmente quando és diferente.”
“Diferente como?”, ela perguntou.
“Tenho paralisia cerebral”, disse ele, sem rodeios.
“Manco, falo devagar. Não sou o que as pessoas acham desejável.”
Lúcia fitou-o. “Isso é absurdo. José, nestas últimas doze horas, deste-me abrigo, calor e bondade. Se os outros não veem o teu valor, o problema é deles, não teu.”
As palavras dela trespassaram-no. Pela primeira vez em décadas, sentiu a possibilidade de ser valorizado.
Quando foram ver o carro mais tarde, este não pegava. As estradas estavam bloqueadas. Lúcia perguntou se podia ficar mais uns dias. O coração de José saltou. “Claro”, disse, tentando soar calmo.
Aqueles dias transformaram o seu mundo. Cozinharam juntos, partilharam histórias e passearam pelos terrenos com os cães. Lúcia fotografava a natureza, mas José reparou que a câmara dela, por vezes, apontava para ele. Pela primeira vez em oito anos, sentiu-se não invisível, mas visto.
Num final de tarde, ao pôr-do-sol, Lúcia perguntou suavemente: “José, alguma vez foste casado?”
Ele congelou, depois confessou num murmúrio: “Nunca estive com ninguém. Nunca beijei uma mulher. Aos quarenta, ainda sou virgem. As mulheres vêem-me como um amigo, nunca mais.”
O peito de Lúcia apertou-se de tristeza e admiração. Aproximou-se. “O erro foi delas. Não conseguiram ver o homem que eu vejo.”
Antes que ele pudesse responder, disse as palavras que mudariam tudo: “Porque eu apaixonei-me por ti.”
José olhou para ela, atordoado. “Isso não é possível. És bonita, independente—poderias ter qualquer um.”
“Mas não quero qualquer um”, disse Lúcia, firme. “Quero-te a ti.” Pegou-lhe na mão. “Posso beijar-te?”
Ele anuiu, trémulo. Os lábios dela tocaram os seus suavemente, depois com mais intensidade, libertando uma vida inteira de desejo. Lágrimas rolaram-lhe pelo rosto. O primeiro beijo aos quarenta—e fora perfeito.
Durante quatro dias, viveram como se estivessem noutro mundo. Mas a realidade intrometeu-se quando o mecânico finalmente chegou. O carro de Lúcia foi reparado. Ela tinha prazos, trabalhos no estrangeiro, uma vida para além da serra. O medo de José regressou como uma sombra.
“Quero que venhas comigo”, disse Lúcia, de repente.
José entrou em pânico. “Não posso. Lá fora, as pessoas vão olhar. Vão rir-se de nós. Vão perguntar o que é que uma mulher como tu está a fazer comigo.”
“Para”, disse Lúcia, severa. “Não és defeituoso. Sabes o que eu vejo? Um homem que construiu uma vida apesar de tudo. Que resgata cães porque entende a rejeição. Que me salvou da tempestade e me fez sentir segura. É esse o homem que amo.” Ajoelhou-se diante dele, com lágrimas nos olhos. “Se não consegues acreditar que mereces amor, então acredita em mim quando te digo que mereces.”
O mecânico terminou o trabalho, mas Lúcia recusou-se a partir sem ele. “Vem comigo, José. Por favor.”
Ele olhou para a casa, para os cães, para a segurança frágil do isolamento. Depois para Lúcia, a mulher que vira através de todos os muros que ele construíra. “Não posso abandonar os meus cães”, sussurrou.
“Então levamos os cães”, disse Lúcia, com lágrimas. “Para onde quer que eu vá, eles vêm também.”
José fechou os olhos, décadas de medo a lutar com uma coragem recém-descoberta. Por fim, disse: “Está bem. Vou contigo.”
Ela beijou-o com firmeza, selando a decisão dele.
Duas semanas depois, José estava no aeroporto de Lisboa, sobrecarregado pela multidão após anos de reclusão. Os cães esperavam em caixas de transporte. Lúcia apertou-lheE, enquanto o avião levantava voo, José percebeu que o verdadeiro lar nunca fora um lugar, mas sim o amor que encontrara nos olhos dela.









Também acho estranho, essa parte não aparece sequer, o tal "pequeno apartamento" só é mencionado como estar em intenções de…